quinta-feira

HOJE ENCONTREI SEU CÃO

Uma crônica
Hoje encontrei seu cão. Não, ele não foi adotado por ninguém, a maioria das pessoas já tem vários cães; aqueles que não tem nenhum não querem nenhum cão. Eu sei que você esperou que ele encontrasse um bom lar quando o deixou aqui, mas ele não encontrou.
Quando o vi pela primeira vez, ele estava bem longe da casa mais próxima e estava sozinho, com sede, magro e mancava por causa de um machucado na pata.
Eu queria tanto ser você naquele instante em que parei na frente dele. Para ver sua cauda abanando e seus olhos brilhando ao pular nos seus braços, pois ele sabia que você o encontraria, sabia que você não esqueceria dele. Para ver o perdão em seus olhos pelo sofrimento e pela dor que ele havia passado em sua jornada sem fim ‘a sua procura...
Mas eu não era você. E apesar das minhas tentativas de convence-lo de se aproximar, seus olhos viam um estranho. Ele não confiava em mim. Ele não se aproximava. Ele virou as costas e seguiu seu caminho, pois tinha certeza de que este caminho o levaria até você. Ele não entende que você não está procurando por ele. Ele só sabe que você não está lá, sabe apenas que precisa te encontrar. Isso é mais importante do que comida, água ou o estranho que lhe pode dar estas coisas.
Percebi que seria inútil persuadi-lo ou segui-lo. Eu nem sei seu nome. Fui pra casa, enchi um balde d´água e uma vasilha de comida e voltei ao lugar onde o havia encontrado. Não havia nem sinal dele, mas deixei a água e a comida onde ele havia buscado abrigo do sol e um pouco de descanso. Veja bem, ele não é um cão selvagem. Ao domesticá-lo, você tirou dele o instinto de sobrevivência nas ruas. Ele só sabe que precisa caminhar o dia todo. Ele não sabe que o sol e o calor podem custar-lhe a vida. Ele só sabe que precisa encontrar você!
Aguardei na esperança de que voltasse a buscar abrigo sob a árvore, na esperança de que a água e a comida que havia trazido fizesse com que confiasse em mim e eu pudesse leva-lo pra casa, cuidar do machucado da pata, dar-lhe um canto fresco para deitar e ajuda-lo a entender que agora você não fazia mais parte de sua vida. Ele não voltou aquela manhã e, quando a noite caiu, a água e a comida permaneciam intocadas. Fiquei preocupado. Você deve saber que poucas pessoas tentariam ajudar seu cão. Algumas o enxotariam, outras chamariam a carrocinha, que lhe daria um destino da qual você achou que o estava salvando – depois de dias de sofrimento sem água ou comida. Voltei ao local antes do anoitecer. Não o encontrei.
Na manhã seguinte, voltei e vi que água e a comida permaneciam intactas.
Ah, se você estivesse aqui para chamar o seu nome! Sua voz é tão familiar para ele. Comecei a ir na direção que ele havia tomado ontem, sem muita esperança de encontra-lo. Ele estava tão desesperado para te encontrar, que seria capaz de caminhar muitos quilômetros em 24 horas. Algumas horas mais tarde, a uma boa distancia do local onde eu o havia visto pela primeira vez, finalmente encontrei seu cão. A sede não o atormentava mais. Sua fome havia desaparecido e suas dores haviam passado. O machucado da pata não o incomodava mais.
Agora seu cão está livre de todo esse sofrimento. Seu cão morreu.
Ajoelhei-me ao lado dele e amaldiçoei você por não estar aqui ontem para que pudesse ver o brilho, por um instante sequer, naqueles olhos vazios. Rezei, pedindo que sua jornada o tenha levado ‘aquele lugar que acho que você esperava que ele encontrasse. Se você soubesse por quanta coisa ele passou para chegar lá...E eu sofro, pois sei que, se ele acordasse agora, e se eu fosse você, seus olhos brilhariam ao reconhecê-lo, ele abanaria a sua cauda, perdoando-o por tê-lo abandonado.
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Um comentário:

  1. Maravilhoso seu conto.
    Quando penso no abandono de um animal assim, me deixa muito triste... Um animalzinho que em sua jornada imposta a ele só esperava o seu dono, dono este que ele amou do seu jeito e que foi abandonado a própria sorte, infelizmente a morte.
    Parabéns, excelente sua história.

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